Mostrando postagens com marcador Metáforas. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Metáforas. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Sobre Dire Straits e redescobrir a paixão pela música

paixão
1.Sentimento tão forte quanto o amor, mas efêmero, provocador, impulsivo, desesperado, inquieto. 

Há alguns anos, eu era extremamente ávida pela escrita. Uma busca rápida pelos arquivos deste blog mostra que há 2 ou três anos não havia dia que se passasse sem algum conto, reflexão, história ou só palavras jogadas fora. Escrevia pelo prazer de escrever, pelo corte que arrancaria o tourniquette que eu nem ao menos sabia que estava lá, mas ao ser arrebentado me permitia respirar. Aí, bom, chegou a vida adulta (de verdade).
As preocupações com dinheiro, emprego, faculdade me fizeram cair naquele clichê que eu tanto criticava: as pessoas que não têm tempo para si. Eu passei a dizer a mim mesma que não tinha tempo para escrever, para ouvir um Animals da vida com a mesma dedicação de antes, para reler 1984 pela trigésima vez e descobrir algo novo sobre a obra. Eu me afastei de todas as coisas que me moldaram e, bem, eu estava ok com isso.
Até que há algumas semanas, eu ouvi o Communiquè. Aquele álbum do Dire Straits que me fez escolher o Jornalismo como profissão. E esse álbum me encheu de uma nostalgia que só o timbre do Mark Knopfler podia provocar em mim. Essa voz grossa, rouca, a melodia que praticamente dança como as palavras de Cortázar, os personagens tão diferentes e iguais em essência e que me transportaram diretamente para a primeira vez que ouvi os acordes iniciais de Once Upon a Time in the West.
Cara, que paixão eu tenho por esse álbum. Paixão porque é mais do que amor, é um desejo impulsivo e desesperado de fazer parte da música (and the music make her wanna be the story and the story was whatever was the song, what it was). Comecei a refletir sobre a música, como há muito não fazia, e perceber que eu mordia os lábios para não sorrir ao cantar News. Que meu corpo gelava com determinadas notas e variações de tom em Single-Handed Sailor. Que era impossível não dançar ao som de Lady Writer. Foi aí que eu redescobri minha paixão por tudo. Pelos livros, pela música, por mim.
Parece estúpido dizer que um simples álbum pode mudar tanta coisa na sua semana, mas música nunca foi algo que poderia ser descrito com a palavra “simples” para mim. Um trecho de Radio Gaga, do Queen, diz que “everything I had to know I heard it on my radio” e é exatamente assim que me sinto – todas as lições valiosas, realmente valiosas, foram aprendidas com a música.
Este é, portanto, mais um dos meus velhos textos de agradecimento. À Mark Knopfler e sua banda por produzirem música tão boa, tão ridiculamente boa que é capaz de alterar percepções e fazer de mim uma pessoa melhor. Obrigada por me lembrar de por que eu digo gosto de música, e não apenas ouço. Obrigada por... bom, existirem.

E fica aqui a minha promessa de um segundo encontro com as palavras.


She gets rock and roll and a rock and roll station and a rock and roll dream

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Drink to me; drink to my healt; you know I can't drink anymore

Eu estou no topo do mundo.
Talvez não do mundo, mas acima de todos os arranha-céus que há muito decoram a selva de pedra que apelidamos de São Paulo. E, aqui em cima, tudo parece como realmente é: desprezível, pequeno, destrutível, de papel.
Percebo que não estou sozinha. Um homem de cabelos encaracolados e olhos pretos (que mais parecem vazios do que coloridos) me encara, um lápis em uma das mãos e uma espada na outra. De repente, ele solta uma risada histérica e os produtos do cabelo derretem. Reconheço-o como o guitarrista daquela velha banda que me agradava; não lembro seu nome. Ele me oferece os dois objetos - recolho ambos. Seu olhar está fixado em mim; não, espere. Atrás de mim. Viro-me e encaro o meu próprio reflexo num espelho solitário (juro que não estava ali antes). Meu reflexo move-se e eu não.
A mão esquerda quebra o lápis. A mão direita leva lentamente a ponta da espada aos lábios. Abaixo os olhos para o meu corpo real - pelo menos acredito ser real - e minhas mãos permanecem imóveis. Volto para o espelho. A espada agora desliza pela minha garganta e sinto a dor da lâmina, cruel, ríspida e sem misericórdia.
Eu estou sangrando.
E o meu reflexo sorri - cínico -, "aqui está sua garganta de volta. Obrigada pelo empréstimo."
da lista de sonhos sobre os quais eu provavelmente não deveria escrever. 

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Direto e niilista... mas dessa vez é pessoal

Lembrai, lembrai do 5 de novembro. Lembrai de como Deus está na chuva. Já parou pra pensar que Deus não precisa ser uma divindade nesse contexto? Tudo o que você é pode ser essa chuva fina da Avenida Paulista. Sua ideologia. O homem que te encara e em seguida beija as mãos da namorada em sinal de culpa pelo ato despercebido. A mulher que grita para os manifestantes irem pra casa sem saber que democracia significa o barulho na cidade. A falta de uma resposta e a conversa indesejada.
Todos os dias eu desço as escadas da estação Brigadeiro sabendo que sou Evey ou Alice e seus pensamentos. Ali atrás não há sinal de estrelas. Isso vale uma metáfora pobre quando se pensa que cada estrela apagada foi uma promessa quebrada, uma ponte desmoronada e uma palavra riscada. Vai me chamar de descrente, niilista - mas o tempo me fez assim. Pessoas e experiências me distanciam da fé de que existe um propósito nisso tudo. Cada cigarro apagado na rua é símbolo de uma tentativa desesperada de se segurar em qualquer coisa palpável nessa São Paulo abstrata.
Talvez seja o 5 de novembro. Talvez seja a coragem desvalorizada e não respondida. Talvez seja O Caçador de Pipas. No fim do dia, a chuva é o que resta de cada minuto que poderia ser apagado. Qualquer coisa para esquecer todas as coisas.

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Você já foi no Hangar 110?

Título alternativo: o ministério das palavras não-ditas adverte que bronquite pode causar desavenças e visita ao tribunal dos artistas e corações sangrentos.

O sonho da Paulista já é tão ano passado. Ninguém me disse que a vida universitária era a porta de entrada para a vida adulta, o trabalho, a falta de tempo e a hipocrisia. Não estou reclamando, eu gosto disso. O que não apetece é a consequência de tudo isso e a falta de coragem de levantar pelo que eu acredito estar certo. Se eu puder te dar um conselho, ele é: orgulho às vezes é humilhação. Evitar conflitos maiores pode resultar em você sendo descartada e nem sempre vale a pena deixar os bens da maioria superarem o bem de um. Alguém me ensina a deixar de acreditar que meu pensamento é pequeno demais diante do resto do mundo?
O que vale é que minha consciência está limpa. E meu boletim também.

domingo, 25 de agosto de 2013

Abre os olhos e descobre o que significa Comfortably Numb

Essa conversa de sentir falta do que costumava ser já ficou tão velha quanto a avenida que costumava chamar de refúgio. Depois de oito meses diretos, essa Paulista virou desgastada. Tá na hora de mudar o discurso, né?
Hoje passeio pelo meu quarto. Muita coisa acontece de um canto ao outro quando sua própria alma se tornou maçante demais; insuportável demais. Percebi que a "antiga eu" nunca deu muito certo. E então decidi que era nova demais pra me preocupar com política; que Pink Floyd traz pensamentos de crise de meia-idade; George Orwell talvez nunca aprendeu a se divertir. Eu me diverti. Céus, como me diverti. Fingi que corpo e mente tinham dezoito anos, mas quem disse que eu gosto de ser adolescente?
Existem dois pólos distantes na minha parede. No primeiro, letras de músicas das minhas bandas preferidas julgam e traduzem o que sempre fui. O segundo parece não se importar; somos humanos ou dançarinos? E The Who grita "you stop dancing!"
Gosto do que fui e do que sou agora. Gosto do meu gosto musical amplo - você sabe, apreciar uma música que te faz arrepiar, mas também dançar sem compromisso ao som de uma canção que não me faça pensar. O problema está naquela crônica sobre o chapéu coco e brincar com as pessoas (entendi minha obsessão por chapéus...) - não foi tão interessante quando deixei que brincassem comigo.
Confortavelmente entorpecida significa encontrar a pessoa que parece perfeita para você e perceber que deixei de ser essencialmente o ideal para ela. Perdi a coragem de despir sentimentos e a ousadia de jogar com as palavras por puro medo de descobrir o que encontraria. Chegou a hora de enfrentar o compromisso: não mais acreditar que sentimentos alheios não importam e que sou jovem e inocente demais para me preocupar com problemas maiores que eu.
Vamos falar sobre equilíbrio?

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Mother, should I (re)build the wall?

Zona de conforto. Não entendo toda essa algazarra em torno do conceito. O que existe de tão errado em respeitar os limites que você mesmo cria? Sua zona de conforto é, afinal, sua zona de segurança, seu escudo contra qualquer coisa que possa machucar. E por que infernos você iria querer se machucar?
Sair da zona de conforto é desconfortável, constrangedor, perigoso e arriscado. Vou fazer melhot reconstruindo aquele muro de tijolos brancos e canções codificadas.

quarta-feira, 1 de maio de 2013

8. Norwegian Wood

“I was always hungry for love. Just once, I wanted to know what it was like to get my fill of it -- to be fed so much love I couldn't take any more. Just once.”
Norwegian Wood - Haruki Murakami

Norwegian Wood. Como foi que isso virou um conceito maior do que uma música ou um livro, bem, não consigo me lembrar. Mas é sinônimo de nostalgia isso, não é? Um dia a minha tatuagem vai dizer this bird has flown, e quem sabe a tinta impregnada que faça acreditar que não arranquei todas as penas possíveis. Pássaros voam quando a terra os desaponta. Voam para o grande Céu de anil e aprendem a amar o vento forte que bate contra o corpo. Aprendar a amar o vento é mais fácil do que aprender a amar e ser amado por uma outra pessoa. 

sábado, 27 de abril de 2013

Eu desejaria uma estrela, mas essa estrela não brilha

Sabe aqueles devaneios de Sábado a noite? Você está prestes a ler um.


Hoje eu olhei para o Céu, e lembrei de uma época onde você podia de fato contar as estrelas. Não sei há quanto tempo exatamente eu contei os pontos brancos e dourados, mas sei que não foi há muito. Gostaria de saber quando foi que as estrelas se apagaram e o céu se tornou um espaço vazio e escuro. Chato. Sem a luz das estrelas, as ruas se tornaram perigosas e horríveis. O mundo por si tornou-se o espaço plano acima de nós. E os desejos se foram com as estrelas. 
Você consegue se lembrar de confiar os seus sonhos a uma estrela brilhante que por uma noite foi o seu porto seguro? Você se lembra de um dia viver em mundo que não era comandado pelo ceticismo e o niilismo? Ora, eu sei que o niilismo pode salvar, mas o que te nutre pode também te destruir. Essa é a nostalgia de uma vida cheia de crenças e esperanças que foram mortas pela certeza de que o que está ruim muitas vezes tende a pior. E eu não sou uma pessoa negativa, veja bem, eu acredito na mudança do mundo, só não acredito nas pessoas que tem o poder de mudá-lo porque elas não acreditam nessa força. 
Escrevi que me perdi em algum lugar, escolhendo a esquerda no lugar da direita ou vice-versa. Acredito que gostaria de continuar perdida, mas me encontrei no céu vazio que me cercou esta noite. Encontrei o meu ceticismo e o meu niilismo. Encontrei a minha descrença no mundo que já foi meu. Deixei que o Lunático tomasse conta dos dedos que flutuaram para encontrar as letras que condenariam o lado escuro da lua. A minha cabeça explodiu em melodias escuras, querido.
E não existe um lado escuro da Lua. Na verdade, é tudo escuro.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

2. Like a Rolling Stone

Go to him now, he calls you and you can't refuse
When you ain't got nothing
You got nothing to lose.

Hoje andei por horas
Atrás de um álibi, uma saída
Acordei perdida; acordei caída.

domingo, 31 de março de 2013

Because something is happening here but you don't know what it is,

do you, Miss Nothing?

 Entra na sala com o pincel nas mãos, mas o estranho já se foi. Aqui está você de novo, pequena Charlotte, e enfim te encontro lutando contra a insônia como se o ontem fosse hoje. Mas falávamos sobre o estranho; ainda ontem esteve aqui para devolver sua garganta e agradecer pelo empréstimo. Também me pediu para te deixar um recado. Ele disse: "Te ligaram e disseram 'beware doll, you're bound to fall' e você achou que estavam brincando." Acredito que até acrescentou um all right, Miss Lonely ao final da nota, mas o nada já é pesado. O importante é que aqui está a sua gargante de volta!
 Aqui está sua voz de volta. Ah, querida, você sabe tão bem qual a sua arma para sair do labirinto - tudo o que a esfinge te pede é a solução de um enigma. O que está acontecendo? Não é o mundo que está ao contrário, é só você; quando não esteve? Que a verdade seja dita, fez-se o contrário para que pudesse voltar a encher essas páginas sem pauta. E agora sai batendo à porta de cada esquina, cinema, livraria e botequim que essa São Paulo tem a lhe oferecer, mas a cidade pode te trair, Charlotte. A cidade pode mentir. Não é todo dia que Drummond vai achar uma flor que nasceu no asfalto - e se Drummond não acha,  quem é você para procurar?
 Irônico é o modo como você costumava gritar How to Be a Heartbreaker quando sempre soube que tava mais pra Jugband Blues. Você prometeu que nunca se comprometeria com esse estranho da... De onde veio, mesmo? Não que importe. Não estamos vendendo nenhum álibi e ele te chama agora, não pode recusar. Bob Dylan te ensinou que quando não se tem nada, não há nada a perder. Isso já faz tempo, Charlotte. Desde que decidiu chamar-se Charlotte. Maldito dia esse, não?

 Tinha planejado algo tão melhor do que esse monte de frases soltas do Dylan, mas às vezes as coisas ruins são o que define. Logo eu volto a escrever alguma coisa boa.


quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Assinado: miss nothing

 Eu sou você; não pode ou quer me afastar. Sempre estive em ti, baby, dizem que não se pode correr do destino, e as estrelas da sua estrada são o sinalizador para a minha redoma - a nossa redoma, onde somos uma.
 Não me diga que não gosta dessa sensação de me ter em você.
 Não me diga que não gosta do escuro.
 Do desconhecido.
 De ser um desastre belamente depressivo.
 E você, que sempre me chamou de alter-ego. Alter-ego é desculpa para personalidade que tem medo de assumir. Sempre foi o seu medo, certo? Todos os dias, todos os anos, você foi a cara do medo. Respire agora, querida. Como é bom estourar o tourniquet, gritar para e aos céus, estar mais alta que as montanhas e mais baixo do que os vales. Eu te fiz assim. Eu te dei a coragem de ser quem sempre foi e temeu ser, ainda que o ser seja nulo. Você não é nada. O mundo é nada. E não existe nada mais maravilhoso do que o nada.
 Bem-vinda, minha criança, ao planeta boom.

misturar mötley crüe com milan kundera com the pretty reckless com crise de identidade com sempre-fui-miss-nothing

domingo, 6 de janeiro de 2013

Quando Florian tornou-se um palhaço bêbado

 Um dia, ao atravessar a rua, me deparei com um palhaço de sorriso triste e olhos caídos.Inconformada, exigi: "anda, palhaço, faz-me rir!" e ele riu. Riu de mim, enquanto braços finos apontavam para o cemitério. Foi nessa que percebi que morri, mas me esqueci de morrer, o desespero me abraçou enquanto caminhava até a cova e de súbito lembrei que era alérgica às flores de parentes saudosos nos túmulos ao meu redor. Por tempo demais não tive o caderno na ponta da caneta; do que é que se fazem as letras? Meu problema é a sua leveza fingida, que me sufoca e me faz tomar ar naquilo que tanto condenamos. Poderia ter me feito senhora de seus outrora tão belos castelos, mas o bobo assumiu o papel de palhaço e o castelo tornou-se lápide - o epitáfio fala sobre abandono. Abandono do que poderia não ter sido e foi.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

vera, what has become of you?

 Trocou a esperança inocente pelo sorriso de crocodilo. Já não é mais Junho querida, e os meses corridos te moldaram até que não reconhecesse a tua sombra ao meu lado, à minha frente. Repito de novo e mais uma vez; não me ensinou a ficar sem a sua presença mas já sei me virar. E o faço melhor que você - sou melhor atriz no seu teatro melancólico com máscaras felizes. Talvez até caberia jogar aqui um "do you remember me and how we used to be and do you think we should be closer?", mas ora, eu tentei e por quatro vezes tive as mãos atadas enquanto sentia os laços se desintegrando. Corda fina essa que usamos.
 Um dia você vai crescer, mon amour. Espero que você cresça, e olhe ao seu redor apenas para encontrar os espaços vazios onde nós estávamos. E talvez você olhará para trás e dirá que não deveria ter me afastado para longe. Talvez eu esteja te esperando. Talvez eu volte a ser sua melhor amiga. Talvez, talvez, e talvez.
 No final do dia... Só estou sendo feliz.

sábado, 15 de dezembro de 2012

Mesmo que não toquem a pele, como é doce o som das gotas que batem contra o guarda-chuva.
São Paulo sentiu sua falta, senhor.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

lunático


 O branco tomou conta dos seus olhos, que se abriram cansados e temerosos. Lembrava-se vagamente das últimas horas – como foi perseguido por milhas e milhas (ou assim lhe pareceu) até que suas mãos foram atadas. Foi nesse momento que sentiu a agulha fina perfurando seu corpo, enquanto o líquido quente invadia suas veias e sugava-lhe o ferro, deixando a sensação de formigamento no lugar. Lembrava-se do sentimento de inutilidade quando já não era dono de seus movimentos e só pode se deixar ser amarrado. E, agora que estava relativamente consciente, sabia que o momento que tanto adiara estava diante de si. Eles o pegaram.
 Voltou a sentir seus braços e pernas e soube que ambos estavam presos por panos fortes à cama. A cabeça ainda estava pesada demais para ser levantada, portanto restou-lhe o movimento dos olhos para perceber onde estava. Frascos que pareciam xaropes se alinhavam perfeitamente pelas prateleiras de um armário de vidro emoldurado por madeira rústica. Não havia janelas; a única saída era uma porta de aço que ficava na frente na cama, rodeada por paredes que eram forradas pelo que pareciam finos colchões brancos, dando-lhe a impressão de que poderia atirar-se contra elas e nenhum dano seria feito. Tudo no quarto era branco, exceto por uma única e solitária rosa vermelha, que repousava na mesa branca ao lado da cama.
Começo de um conto qualquer. Dois parágrafos sem conclusão podem fazer sentido se souber ler com outros olhos. 

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Carta para ninguém

 Fiz besteira.
 Era o que eu costumava dizer quando isso acontecia. Eu escolhia alguém de confiança e dizia “fiz besteira”. Mas isso foi uma época diferente. Naqueles dias eu procurava conforto e ajuda, enquanto hoje tenho a consciência de que foi só dessa vez. Uma vez pelo ano inteiro, esse dois mil e doze que está finalmente acabando.
 Eu me lembro bem do começo do ano, tão bons foram aqueles dias. Diziam-me que eu parecia melhor, que no ano anterior eu andava abatida e tudo era verdade. Naqueles primeiros meses fui tomada por uma leveza, uma calmaria e até esperança que nunca conheci antes. Mas sempre fui feita de pedaços e não demorou muito para que eu desmoronasse. Mesmo assim, algo estava mudando.
 Comecei a querer provar que era autossuficiente e este é um hábito que se mantém até hoje. Preferi conviver esses duzentos e quarenta e cinco dias com os fragmentos do meu corpo e alma do que deixar alguém me consertar. Também abandonei os péssimos hábitos dos anos anteriores e passei a me apoiar somente em discos e livros. E essa suposta autossuficiência me transformou em quem sou hoje, nove meses depois de me dizerem que eu “parecia melhor”.
 Gosto e desgosto dessa nova versão do meu eu. O reencontro (e em alguns casos encontro) com a literatura e boa música me permitiu abrir os olhos para inúmeras coisas, mas choque de realidade pode doer. Porém, essa foi a minha escolha, a minha preferência de entender e sofrer a realidade do que continuar a viver naquele mundinho estúpido onde eu precisava me encaixar. Acredite, apesar do teor cansado e melancólico deste relato, não me encaixar foi a melhor escolha.
 E assim o ano se desenrolou através de vales e montanhas. Agora que paro para pensar, o ano foi curto, mas as noites foram longas. Nunca fui muito próxima do sono, mas este ano ele pareceu terminar definitivamente o relacionamento comigo. Eu deitava (ou deito, pois estou na mesma situação neste exato momento) na cama e esperava por horas intermináveis pelo segundo de misericórdia onde eu finalmente cairia no sono. As noites sempre foram, para mim, o velho paradoxo de contentamento descontente. São o meu momento de inspiração, de criatividade, de vontade de escrever, e de pensar. Pensar é perigoso.
 Sem mais delongas, dois mil e doze foi um ano dispensavelmente indispensável (gostei dessa coisa de paradoxos hoje, hein?). Ouvi coisas que gostaria de poder apagar, fiz coisas que me arrependo mais do que em anos anteriores. Aprendi muito. Com livros, músicas e pessoas, apesar de eu não ser uma pessoa tão agradável quanto costumava ser. E todos esses sentimentos, lembranças e palavras que eu gostaria de apagar vieram à tona hoje e eu precisei tirar isso de mim. Da única maneira que eu conhecia.
 Não me arrependo. Como disse no começo, foi só uma vez pelo ano. Foi só pelo sentimento de leveza do “afterwards”.
                E eu aprendi que essa leveza é insustentável. 

domingo, 21 de outubro de 2012

Humanos, de menos humanos!

É noite de espetáculo,
de cores tão vivas e pessoas tão mortas;
de casos e acasos tão longes do solo.
Ora, mais valem verdades por linhas tortas!

Me mostram sorrisos tabelados
e me vendem mentiras ensaiadas.
Condenam olhares chocados
e condenam máscaras desmascaradas.

Um dia o velho gritou "Não é certo!
No meu tempo as coisas foram diferentes...
Na minha época não fiquei quieto,
na minha época me arrancaram os dentes."

Cretino! Mentiroso!

Século atrás, século a frente
e diga-me, mudou o quê?
Não houve povo outrora contente.
Desde sempre pessoas por quê?

Humano, de menos humanos;
de movimentos planejados,
de alegria por baixo dos panos,
de pensamentos engradados.

Dos velhos arrancam as dentaduras
enquanto dos jovens arrancam as asas.
Algo falta, sempre falta.
Falta o algo.

Algo pelo que gritar, mudar, quem sabe até lutar.
Falta o que falta, falta o algo.
Esse algo que não sei, falta decifrar
Falta que o algo torne-se algo.

Humanos, de menos humanos.
Condenados a sentir falta desse algo
que nos torne demasiadamente humanos.
Mas ser humano dá preguiça.

E preguiça não rima com algo.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Quisera eu que isso fosse um poema.

Quisera eu algum dia ser poeta
E com olhos assim tão ternos
O mundo ditar.
Quisera eu na ponta da caneta
Deter o destino, o amor, o ardor
Fazer do papel realidade idealizada
E na ideia assim mergulhar.
Quisera eu me iludir!
Quisera eu ao menos uma vez
Os olhos fechar e na mente divagar
Caminhar pelo paraíso do poeta
A avenida do cronista
O jardim do romancista.
Quisera eu as palavras decifrar
E nelas a beleza encontrar.
Fugir para o desconhecido...
Quem liga para o hoje? O importante é o amanhã!
Este amanhã tão belo e assustador
Este amanhã incerto
Este amanhã que hoje surge.
Mas não sou poeta e na noite não enxergo o arco-íris
Não se confunda, querido leitor - isso não é um poema
Não há nestas linhas tortas lirismo, rima, sentimento
E não existe poema sem sentimento!
Hei de julgar-me pela falta de parágrafos
E por uma página o chão abandonar.
Quisera eu algum dia ser poeta.
Quisera eu...
Voltemos à prosa!

domingo, 7 de outubro de 2012

E foi por bem querer...

 Eu sou sua menina, viu.
 E hoje o coração não tá cheio de poesia; hoje aumento o volume da música, mas a guitarra do David Gilmour não é alta o suficiente para calar os pensamentos. Hoje vejo como a Lua é grande - ela é grande, eu sou pequena. Hoje eu procuro o seu lado sombrio, e não pergunte como! encontrei o arco-íris na noite.
 Sou o apunhado de pedaços que espalham-se pelos lugares, pela cidade, pelo país. Pode me encontrar nos paralelepípedos de São Paulo ou no mar salgado do Rio de Janeiro; no tédio do Rio Grande do Sul ou no passado de Santa Catarina. Vá em frente, é sua vez de tirar outro pequeno pedaço! Guarde-o onde quer que esteja, essa parte tem o seu nome escrito, senhor - essa parte espera pela dor do bisturi arrancando-a. Doce é a dor, doloroso é o amor.
 Me fiz em mil pedaços pra você juntar. 

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

 Brinquedos não foram feitos para te acompanhar durante a eternidade e droga!, desisti da minha boneca preferida.